17/12/07

O MATCH QUE NUNCA ACONTECEU - FISCHER VS KARPOV

Em plena Guerra Fria, o Estadunidense "Bobby" Fischer, venceu o Russo Boris Spassky, em Reiquiavique, na Islandia, no match disputado, entre 11 de Julho e 1 de Setembro de 1972, para o titulo de Campeão Mundial de Xadrez.



Fischer, retirou a Spassky, um titulo que desde 1948, pertencia aos soviéticos.
A Federação da URSS decide como prioridade máxima recuperar algo que lhes pertencia à quase 30 anos.
Anatoly Karpov, é a figura mais prometedora para o fazer, tendo por isso, todo o "apoio institucional" para cumprir a missão.



Uma vez consagrado Campeão do Mundo, "Bobby" Fischer, não voltou a participar em qualquer torneio.
A decisão é estranha para alguém que prometia antes do confronto com Spassky, jogar todos os torneios que pudesse de forma a ganhar o máximo de dinheiro possivel.
A primeira consequência surge em 1973, onde o Óscar de Xadrez é entregue a Anatoly Karpov, cidadão modelo e esperança do xadrez soviético.

A grande surpresa !
Congresso da FIDE, em Nice, ano de 1974.
Um telegrama de Fischer com mais de 800 palavras !
Parágrafo por parágrafo, Fischer apresentava as suas condições para disputar o match de 1975.
A condição principal, era que se jogasse a 10 victórias, sem serem contabilizados os empates.
Se, a pontuação chegasse a ser de 9 a 9, Fischer manteria o titulo.



O carisma de Fischer era tão grande, que as suas condições foram debatidas e finalmente submetidas a votação.
A maioria dos Delegados aceitou todas as exigências do Campeão do Mundo, excepto uma;
Jogar um match sem limite pré-fixado de partidas.
Ficou decidido que não deveria haver mais de 36 partidas, no fim das quais, ganharia o xadrezista que tivesse obtido maior numero de victórias.

Em resposta a esta decisão, o Congresso recebeu outra missiva de Fischer;
"No meu telegrama anterior, já explicava que as minhas condições não eram negociáveis...
Entendo que tenham sido recusadas por maioria de votos, mas ao fazê-lo, a FIDE opoêm-se à minha participação no Campeonato do Mundo de 1975.
Por consequência, renuncio ao meu titulo de Campeão do Mundo FIDE."

O Congresso aceitou a abdicação do "Rei", no entanto, enviou um telegrama propondo uma reconciliação.
Não houve resposta de Fischer...


O que estava aqui em causa ?
Dois blocos da politica mundial que dividiam o Congresso.
Alguns burocratas, daqueles que entram no xadrez para o destruir ou forrarem-se no jogo de interesses.
E muitos admiradores das proezas xadrezisticas de Fischer, mas alguns já cansados das suas "excentricidades".

No entanto, faço recordar aos leitores deste blogue, o match anulado, que decorreu entre 10 de Setembro de 1984 e 15 de Fevereiro de 1985. O primeiro entre Anatoly Karpov e Gary Kasparov.



Só à 32º partida, Kasparov "aprendeu" a ganhar a Karpov !
À 36º partida, o resultado era de 5 a 1, favorável ao detentor do titulo.
Ou seja, o match que decorreu de 3 de setembro a 9 de Outubro de 1985 e no qual Kasparov derrotou Karpov por 13 a 11, nunca teria acontecido !
Karpov, teria revalidado no primeiro duelo entre os dois.
Só em 1988, Kasparov poderia voltar a disputar o ceptro de Campeão do Mundo.
Históricamente, até esse mesmo ano, Gary Kasparov, foi por 3 vezes Campeão Mundial !



Quase ninguém acreditava que o match não se iria realizar.
Uma incrivel oferta chega das Filipinas.
Eram oferecidos 5 milhões de doláres da época para Fischer e Karpov jogarem em Manila !

Contudo. Fischer nunca mais pronunciou uma só palavra que fosse.
A pedido de váriadissimos Países, foi convocado um Congresso extraordinário da FIDE, para debater e se necessário, rever as condições para a final do Campeonato do Mundo aprovadas em Nice.
O objectivo destas acções era satisfazer todas as exigências de Fischer e deste modo persuadi-lo a jogar.

O Congresso extraordinário da FIDE, decorreu no dia 17 de Março de 1975, na cidade Holandesa de Bergen aan Zee.
Por pequena maioria de votos, foi aceite um match ilimitado.
A Federação da URSS, opôs-se.
O Congresso também confirmou a decisão anterior de jogar a 10 partidas ganhas.
No entanto, a maioria dos Delegados recuaram num ponto;
Ficou decidido que o empate a 9-9 não seria executivo e o match prosseguiria até à décima victória de um dos jogadores.

Outra recordação:
- O match decorrido em Sevilha, entre 12 de Outubro e 19 de Dezembro de 1982, entre Gary Kasparov e Anatoly Karpov.
Nunca karpov esteve tão perto de oficialmente derrotar Kasparov !
O resultado final de 12 a 12 diz tudo.
Kasparov, retém o titulo, estando em igualdade pontual, por as regras nessa altura o permitirem.
Estaria Fischer, realmente a pedir assim tanto ?
E os matches de antecessores como Lasker, Capablanca e Alekhine ?
As regras estipuladas eram muito mais gravosas para o candidato ao titulo do que estas, exigidas por Fischer para jogar, seriam para Karpov.




"Parece-me agora" - Escreveu Anatoly Karpov no livro "Amanhã será uma nova batalha", publicado em Moscovo no ano de 1982 - " Que se tivessemos reunido pessoalmente, teriamos encontrado um ponto de coicidência. Mas, as negociações foram conduzidas através de representantes e chegavam ao dominio público, de forma que os meios de comunicação construiram montanhas de um granito de areia, o que só serviu para agravar a situação."


Nota: Isto não se passou exactamente assim.
Em Espanha muito boa gente sabe que Fischer e Karpov dialogaram directamente em Cordoba.
Fischer tentava fazer valer as propostas que apresentou em Nice e Karpov não queria prolongar o match acima da sexta vitória de um deles.
A União Soviética queria recuperar o titulo mundial e entrar num match demasiado prolongado, colocava em causa essa recuperação do ceptro mundial.
O ponto mais fraco de Karpov, sempre foi a sua resistência fisica.


O silêncio de Fischer manteve-se, confirmando que era o primeiro Campeão Mundial a abdicar do seu titulo.


Em 5 de abril de 1975, em Moscovo, o presidente da FIDE Max Euwe, proclama solenemnete Anatoly Karpov como o 12º Campeão Mundial.


Finalizo este artigo, com uma declaração recente de Karpov;
"Sinceramente, acredito que em 1975 as probabilidades de Fischer ganhar o duelo eram maiores que as minhas, mas, se falarmos de 1976, já não estou tão seguro porque evoluí muito num só ano."



"Bobby" Fischer não queria apenas ganhar a Karpov.
Fischer queria ganhar deixando Karpov a zero !
E não obteve as condições que procurava;
Um match longo, onde o fim não estivesse à vista.
Até ao 6 a zero, já sabemos como funciona;
Basta relembrar Taimanov e Bent Larsen.
Só que aqui havia um problema;
Karpov, era de uma nova geração.
Um jogador prático, psicológicamente bem estruturado e que não era autónomo nas suas acções.
As decisões tomadas por ele, já antes tinham sido "aconselhadas" pela poderosa Federação Soviética de Xadrez.

Conclusão:
Para Karpov ter a certeza da victória em 1975 ?
Só mesmo não tendo de defrontar Fischer...




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ONDE ESTÃO AS PEÇAS ?

Devido a variantes calculadas mentalmente e que não verificamos, não só surgem más posições, como também, não conseguimos obter as boas por as recusarmos antecipadamente.

Quando Mikhail Botvinnik era Campeão do Mundo, em certa ocasião passou por alto uma victória à qual um espectador afirmou:
"- Viram todos os principiantes que estavam na sala !"

Mikhail Botvinnik - Svetozar Gligoric
Hastings (Inglaterra), 1961
Jogam as brancas


1.Rf7?; 1.Txg7´

As negras acabam de retirar o seu bispo de "c3".
Botwinik, observou dois movimentos naturais.
1.Rf7 e 1.Txg7+.
O último parecia bom, devido a 1...,Rxg7 2.f6+, Rg6 3.f7 e o peão é promovido.
De nada serve, 3...,Te2+, por causa de, 4.Be6.

No entanto, Botvinnik estudou e estudou a posição.
Depois, de muito reflectir, elege como melhor movimento:
1.Rf7?

Depois da partida, perguntaram-lhe se não tinha visto a combinação.
"Sim." - Respondeu - "Mas, ao visualizar a posição cometi um erro e situei mentalmente o rei negro em "g7", em vez de "g6".
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FANTASIANDO

Existe um desejo natural e muito humano de querer jogar boas partidas com movimentos brilhantes e acções dramáticas.
Mas, o melhor, é mesmo assegurarmos o pontinho, calculando de maneira precisa.
Querem ver ?

Pal Benko - Juan Pedro Dominguez
Las Palmas de Grand Canaria (Espanha)
1972
Jogam as brancas


1.Txh7+??; 1.Bf3

Benko, tem um peão de vantagem e pode ganhar qualidade com, 1.Bf3.
Não estava em apuros de tempo.

No entanto, começa a preocupar-se.
Podia ser dificil ganhar o final depois de, 1.Bxf3, Txf3 (2.Rg2, Txd3 3.a4?, Ta3 ou, 3.Ta1, Tc3 ) !

Visto isto, procura algo melhor e encontra:
1.Tb7??, Rxb7 2.Te2;

Muito inteligente...
Agora, 2...,Txe2 3.Txf3+, conduz a um final de bispo contra cavalo ganho para as brancas.
E porquê ?
Porque as negras estão obrigadas a utilizar uma das suas peças para deter o peão de "a".

Em vez disto, as negras encontraram:
2...,Txg2+ !

A resposta das brancas é surda para o ouvido humano e não podia ser outra senão:

3.Abandona !
0:1

Resumindo:
As respostas sensatas, podem ser menos bonitas que as respostas combinatórias.
Só que no xadrez, fazemos os movimentos que a posição nos pede e não o que fantasiamos.
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